Dólar de Singapura mostra características de moeda forte, mas ainda não chega ao nível do iene ou franco suíço

O dólar de Singapura tem apresentado baixa volatilidade, o país mantém as contas públicas em ordem e a economia é sólida, segundo especialistas. Porém, a maneira como a cidade-estado administra sua moeda limita movimentos mais agressivos de investidores. Mesmo assim, analistas apostam que a moeda pode se tornar o próximo refúgio seguro, no mesmo patamar do franco suíço.

Um funcionário conta notas de dólar de Singapura no distrito financeiro de Raffles Place, em Singapura, no dia 6 de outubro de 2022.

Em momentos de incerteza, investidores costumam buscar ativos considerados “porto seguro” — como ouro, títulos do Tesouro e moedas fortes, como o iene japonês, o dólar americano e o franco suíço. A expectativa é que esses ativos mantenham ou até aumentem seu valor em épocas de turbulência no mercado.

Apesar de o dólar americano ainda ser a moeda de reserva preferida no mundo, ele vem enfraquecendo. O índice do dólar já caiu mais de 9% neste ano. O futuro do iene japonês está incerto por preocupações comerciais. Diante desse cenário, alguns analistas enxergam uma possível alternativa surgindo: o dólar de Singapura.

Christopher Wong, estrategista de câmbio do OCBC, disse à CNBC que o dólar de Singapura já funciona como uma espécie de “porto seguro”, especialmente na Ásia e em mercados emergentes.

“Apesar de não ter o mesmo peso global que outros portos seguros tradicionais, como o dólar dos EUA, o iene japonês ou o franco suíço, o dólar de Singapura costuma mostrar um comportamento mais defensivo em períodos de estresse financeiro — principalmente quando as crises estão concentradas na Ásia”, afirmou Wong.

O dólar de Singapura vem se fortalecendo frente ao dólar americano, com alta de cerca de 6% só neste ano. Segundo previsão do banco Jefferies, a moeda pode chegar à paridade com o dólar nos próximos cinco anos.

“O dólar de Singapura realmente é uma das moedas porto seguro do mundo, mas pode não ser a próxima grande referência”, avalia Omar Slim, responsável pela área de renda fixa na Ásia da PineBridge Investments.

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“O que faz dela um porto seguro é a força das instituições de Singapura, a base econômica sólida e resiliente, além de políticas públicas responsáveis, especialmente no controle das contas do governo”, explicou.

Felix Brill, diretor de investimentos do VP Bank, concorda que o dólar de Singapura tem várias características de moeda forte dos tempos atuais, como estabilidade macroeconômica, instituições robustas, superávit em conta-corrente e baixo risco político.

Brill ressaltou que o modelo de política monetária de Singapura trouxe “estabilidade excepcional” à moeda, que é justamente o que investidores buscam nos momentos de fuga para ativos mais seguros.

Diferente da maioria dos países, Singapura não usa a taxa de juros para controlar sua moeda. Em vez disso, fortalece ou enfraquece o dólar de Singapura em relação a uma cesta de moedas de seus principais parceiros comerciais, em uma faixa determinada. A cotação exata não é fixa, e o dólar de Singapura pode oscilar dentro dessa faixa, cujos limites não são divulgados ao público.

Jeff Ng, chefe de estratégia macro para Ásia do Sumitomo Mitsui Banking Corporation, estima que essa faixa de controle tem uma amplitude de 4%. Ele diz que esse modelo reduz a volatilidade, trazendo menos riscos e mais previsibilidade no curto prazo.

Apesar dos avanços, especialistas apontam alguns obstáculos para que o dólar de Singapura se torne uma moeda globalmente reconhecida como porto seguro.

O primeiro é o tamanho do mercado da moeda. Dados do Banco de Compensações Internacionais de 2022 mostram que o dólar americano representa 88% do mercado de câmbio, enquanto o iene japonês e o franco suíço respondem por 17% e 5%, respectivamente. Já o dólar de Singapura aparece com apenas 2%. Essa pesquisa é feita a cada três anos; a próxima está prevista para setembro de 2025.

“Apesar do grande respeito internacional, Singapura tem uma economia pequena, e o dólar local ainda não tem o volume de negociações nem o mercado de títulos tão profundo quanto o iene ou o franco suíço”, avalia Brill, do VP Bank.

Além disso, a própria política monetária que trouxe tamanha estabilidade ao dólar de Singapura é também o que limita seu avanço.

Brill explica que, por ser uma moeda “administrada”, o espaço para especulação e grandes apostas do mercado é limitado. Isso reduz a liquidez e a profundidade do mercado, dois pontos fundamentais para moedas que realmente atuam como porto seguro global.

“Ou seja, o modelo traz credibilidade — mas dificulta o crescimento da moeda”, resume Brill.

Outro fator é a forte dependência de Singapura das exportações. Dados do Banco Mundial mostram que as exportações representaram 178,8% do PIB da cidade-estado em 2024.

Com isso, segundo Trinh Nguyen, economista sênior do Natixis Corporate & Investment Banking, a Autoridade Monetária de Singapura não deve querer que o dólar local se valorize demais.

“Se os investidores começarem a comprar ativos em dólar de Singapura em excesso, isso vai puxar a moeda para cima”, alerta Nguyen. “Se o dólar de Singapura ficar caro demais e perder competitividade, a Autoridade Monetária não deve aceitar isso, pois considera prejudicial para a economia do país.”

Dólar de Singapura pode ser usado para reduzir riscos cambiais. Jean Chia, chefe global de investimentos do Bank of Singapore, afirmou que a moeda pode ter um “papel muito importante na diversificação”. Segundo ela, “essa pode ser a terceira moeda em muitas conversas sobre diversificação de carteira”.

Os especialistas concordam que a moeda de Singapura tem potencial para, aos poucos, alcançar um status equivalente ao do franco suíço, mesmo que não chegue ao nível do iene ou do dólar americano.

Jen-Ai Chua, analista de pesquisa para Ásia do Julius Baer, não descarta que o dólar de Singapura evolua de porto seguro asiático para uma referência global, mas diz que isso pode levar tempo.

Brill, do VP Bank, lembra que o status de moeda forte é construído ao longo de décadas, com respostas consistentes a crises. Apesar do bom desempenho do dólar de Singapura em crises regionais, ele ainda não é a primeira escolha em períodos de instabilidade global.

“Com o tempo, o uso internacional maior, mercados locais mais acessíveis e estabilidade constante podem mudar esse cenário aos poucos”, acredita Brill.

Slim, da PineBridge, também vê um futuro promissor para o dólar de Singapura, principalmente num momento em que os portos seguros tradicionais têm perdido força: “O mundo está cada vez mais em busca de moedas estáveis, e acredito que o dólar de Singapura deve entrar no topo dessa lista. Pode até não chegar a ser o que o dólar americano e o iene já foram, mas tende a ser visto cada vez mais como o ‘franco suíço da Ásia’.”

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