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“A mulher não precisa sair correndo: ela precisa, primeiro, voltar a se escutar”
Publicado 04/10/2025 • 10:09 | Atualizado há 2 dias
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Publicado 04/10/2025 • 10:09 | Atualizado há 2 dias
Pexels
A ideia de que basta ter independência financeira para deixar um relacionamento abusivo já se provou limitada. Mesmo mulheres bem-sucedidas e com boa formação permanecem presas a vínculos que envolvem manipulação, humilhação e perda de identidade. Em muitos casos, o que falta não é dinheiro — mas espaço interno para reconhecer o que se vive como violência, e redes externas que acolham essa dor.
Nesta entrevista, a advogada e terapeuta Mayra Cardozo, especialista em gênero e com atuação clínica e jurídica no acolhimento de vítimas, explica por que romper com um agressor é mais processo do que ato. E como a escuta empática, a reconstrução da autonomia emocional e a desconstrução de ideais culturais sobre o amor são fundamentais nesse caminho.
Mulheres independentes financeiramente continuam presas a relações abusivas. Por quê?
Porque o dinheiro não é suficiente quando a autoestima foi corroída. A violência psicológica atua justamente nesse ponto: ela fragiliza a identidade da mulher, distorce sua percepção da realidade e a faz duvidar de si mesma. Muitas mulheres até têm condições de sair, mas não se sentem capazes. Estão emocionalmente capturadas por um vínculo que mistura medo, culpa e a esperança de que tudo ainda vai mudar.
>>> Leia mais da coluna Brazil Health
O que você costuma recomendar para quem já percebe os sinais, mas ainda não consegue romper?
O primeiro passo não precisa ser a ruptura imediata. Esse discurso do “sai logo” pode ser paralisante e gerar ainda mais culpa. Em vez disso, procuro trabalhar com pequenas reconexões: retomar a terapia, fortalecer vínculos com amigas que o agressor tentou cortar, reorganizar documentos, abrir uma conta bancária, resgatar hobbies que tragam identidade. Cada gesto é uma brecha no ciclo de opressão — e isso é o que torna a ruptura possível e sustentável depois.
O que a escuta empática muda no acolhimento das vítimas — tanto na Justiça quanto na rede de apoio?
Muda tudo. No sistema de Justiça, quando uma mulher é recebida com frieza ou descrença, a instituição repete a mesma lógica de desqualificação que o agressor já impôs. Isso é revitimização. A escuta empática precisa ser uma exigência ética. Já na clínica e na rede de apoio, essa escuta tem efeito reparador. Quando a mulher é finalmente ouvida — sem julgamento, sem pressa — ela começa a legitimar a própria experiência e recuperar a confiança em si.
O que torna o gaslighting e outras formas de violência psicológica tão difíceis de identificar?
Justamente o fato de serem sutis e contínuas. O gaslighting é uma manipulação que vai minando a percepção da vítima até ela duvidar da própria sanidade. O agressor distorce, nega, inverte fatos. E como não deixa marcas físicas, essa violência é muitas vezes invisibilizada — inclusive pela própria mulher. Isso a isola ainda mais e dificulta a busca por ajuda.
A romantização do amor tem um papel nesse ciclo?
Sem dúvida. Desde pequenas, as mulheres são ensinadas a associar amor com sacrifício, dor e renúncia. Músicas, filmes e novelas reforçam que o ciúme é prova de amor, que o controle é cuidado, que o sofrimento faz parte. A famosa frase “o amor tudo suporta” legitima muitas formas de abuso. Romper com esse imaginário é fundamental. Amor não é posse, nem anulação. Amor só existe com respeito e liberdade.
Você costuma dizer que “sair da relação é processo, não ato”. Pode explicar melhor?
Essa frase sintetiza o que vejo todos os dias na clínica e no trabalho jurídico. A mulher não acorda um dia e sai — isso é exceção. Na maioria das vezes, ela vai saindo aos poucos, internamente, antes mesmo de dar um passo visível. Cada pequena reconexão com sua vontade, cada decisão que prioriza seu bem-estar, é parte desse processo. Valorizar esse caminho é respeitar o tempo e a complexidade de cada história.
Quais os principais entraves jurídicos hoje para combater a violência psicológica?
A maior dificuldade ainda é provar. Mesmo com a tipificação da violência psicológica como crime, a coleta de provas é desafiadora. O Judiciário ainda valoriza demais os indícios físicos e concretos, ignorando o que é subjetivo, mas profundamente destrutivo. Além disso, muitas vítimas ainda são desacreditadas ou tratadas com desdém ao relatar sua dor — o que, novamente, reforça o ciclo de violência.
Como sociedade, o que precisamos transformar para proteger as mulheres da violência invisível?
Precisamos, primeiro, reconhecer que violência psicológica é violência. E que ela adoece, paralisa, destrói. Precisamos abandonar a imagem da mulher forte que aguenta tudo e parar de culpar as vítimas por não reagirem como esperamos. É urgente investir em políticas públicas, capacitação de profissionais e educação afetiva desde cedo — para meninas e meninos. Valorizar a autonomia emocional das mulheres é fortalecer a democracia. Porque uma sociedade que silencia suas mulheres está, no fundo, aceitando viver mutilada.
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