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Vida nas organizações Joaquim Santini

Cultura do excesso: quando o sintoma vira sistema

Publicado 15/08/2025 • 07:13 | Atualizado há 8 horas

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Joaquim Santini

Pesquisador e palestrante internacional, diplomado em Psicologia Clínica Organizacional e mestre em Consulting and Coaching for Change no Insead ( european business school, na França), graduado e mestre em Engenharia Mecânica pela Unicamp. Fundador da EXO - Excelência Organizacional.

KEY POINTS

  • No coração silencioso das empresas, uma epidemia se alastra sem alarde: a cultura do excesso. Não se trata apenas de jornadas longas ou metas inalcançáveis.
  • Trata-se de algo mais profundo — um modo de funcionamento sistêmico que transforma o “sempre mais” em princípio de gestão, métrica de valor e critério de pertencimento.
  • Nessa cultura, quantidade substitui qualidade, urgência sufoca estratégia e ocupação permanente é confundida com relevância.

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No coração silencioso das empresas, uma epidemia se alastra sem alarde: a cultura do excesso. Não se trata apenas de jornadas longas ou metas inalcançáveis. Trata-se de algo mais profundo — um modo de funcionamento sistêmico que transforma o “sempre mais” em princípio de gestão, métrica de valor e critério de pertencimento.

Ao longo de minha trajetória como pesquisador e consultor em vida organizacional, identifiquei sinais recorrentes, subterrâneos e muitas vezes normalizados que, em conjunto, configuram esse fenômeno que denominei cultura do excesso. Essa formulação não se limita a um conceito abstrato: ela surgiu da escuta atenta e da análise estruturada de padrões simbólicos, emocionais e operacionais que se repetem em diferentes tipos de organização.

Trata-se de uma dinâmica invisível e legitimada que adoece silenciosamente os ambientes de trabalho, mesmo sob a aparência de eficiência, energia e alto desempenho.

Nessa cultura, quantidade substitui qualidade, urgência sufoca estratégia e ocupação permanente é confundida com relevância. O tempo deixa de ser recurso e vira adversário. A produtividade é medida pelo volume, não pelo impacto. E corpo, mente e vínculos são levados ao limite, como se fossem infinitos.

Mais do que um excesso de comportamento, o que se instala é uma lógica institucionalizada, muitas vezes celebrada. A pausa vira desvio. O cansaço, insígnia de valor. O sofrimento, prova de comprometimento. Ela se infiltra pelas recompensas simbólicas e pelos discursos motivacionais. Ela não se impõe pela força, mas pelo elogio. E é justamente essa aparente positividade que a torna tão difícil de perceber.

Suas causas são muitas, mas costumo sistematizá-la em um núcleo conceitual que chamo de As Correntes Invisíveis da Cultura do Excesso — seis forças estruturantes que explicam por que e como essa lógica se consolidou como norma em tantos contextos organizacionais:

1. O curto-prazo como bússola
A lógica dos trimestres financeiros encurtou a visão estratégica. O que não traz retorno imediato é descartado. A pressa ocupa o lugar da reflexão. Pensar virou luxo.

2. A tecnologia como corrente contínua
A hiperconectividade dissolveu os limites entre vida e trabalho. Estar sempre online virou norma. O descanso passou a ser um privilégio negado. A mente não desliga. O corpo não para.

3. A burocracia como ritual de controle
Criou-se uma liturgia de autorizações, comitês e checklists. O trabalho real cede espaço ao trabalho sobre o trabalho. O sentido escoa pelos processos. A lentidão é promovida em nome da ordem.

4. Símbolos distorcidos de sucesso
Exaustão virou mérito. Ostentação virou liderança. Resiliência sem limite virou troféu. A aparência venceu a substância. E o sofrimento psíquico passou a ser romantizado como se fosse virtude.

5. Precariedade emocional dos vínculos
A insegurança silenciosa contamina relações. Com contratos fluidos e pertencimentos frágeis, muitos tentam provar valor através da hiper entrega. O medo de ser descartado alimenta a auto violência produtiva.

6. Tensão geracional como espelho simbólico
A Geração Z expõe as rachaduras do modelo. Ao recusar a glorificação da sobrecarga e buscar sentido, ela ilumina pactos antes invisíveis. Quando ouvida, essa fricção pode virar travessia.

Dois amplificadores agravam esse quadro:

  • A inteligência artificial, quando mal integrada, apenas acelera as cadências sem redesenhar o humano. A pressão aumenta. O sentido se dissolve.
  • O desprezo ambiental reforça a extração desenfreada. O que parecia produtividade retorna como risco, custo e colapso.

Sintomas da Cultura do Excesso: quando o anormal vira norma

Abaixo, organizo os principais sintomas identificados na análise de campo e em projetos de escuta profunda dentro de organizações:

  • Workaholics como heróis silenciosos: A exaustão é premiada. A superprodução mascara feridas narcísicas. O sofrimento é institucionalizado sob o rótulo de dedicação.
  • Comunicação que ofusca o essencial: A fala excessiva substitui a escuta. A urgência encobre a falta de alinhamento. O ruído vence o foco.
  • Status como medida de valor: A vitrine substitui a entrega. A aparência vira métrica. O pertencimento se dissolve na superficialidade performática.
  • Competitividade que destrói o coletivo: O "melhor" é o mais individualista. A cooperação é sacrificada no altar do mérito solitário. A inovação se cala diante da insegurança.
  • Burocracias que esvaziam o propósito: A lentidão é celebrada como rigor. A criatividade é moída no comitê. O tempo é refém do processo.

Liderança como Ato de Nomeação

Romper com esse sistema exige coragem simbólica. Exige nomear o que nos consome. Exige escutar o que se cala por lealdade ou medo. Líderes que reforçam o excesso cobram mais do que praticam. Silenciam o sofrimento. Valorizam presença, não propósito.

Já os líderes que transformam reconhecem que mais não é melhor. Eles instituem limites. Simplificam o que trava. Protegem o tempo. Recompõem os vínculos. E devolvem humanidade ao trabalho.

A Saída: Pactos Regenerativos

Não há mudança real sem novos pactos organizacionais. Algumas direções concretas:

  • Reduzir prioridades sem perder ambição.
  • Trocar volume por valor real.
  • Valorizar a desconexão como parte da performance.
  • Reconhecer o impacto, não o burnout.

Quando o Humano Rompe o Ciclo

Cada pessoa pode ser catalisadora dessa virada. Não é preciso esperar grandes reformas: ela começa nas conversas que devolvem sentido, nas escolhas que protegem dignidade e nas lideranças que sabem parar para pensar.

A saúde organizacional não é um programa — é um movimento. E ele começa agora.

No futuro, a vantagem competitiva não estará na exaustão que as empresas conseguem extrair, mas na vitalidade que conseguem preservar.

Quando o humano volta ao centro, não muda apenas o modo de trabalhar.
Muda, sobretudo, o que significa vencer.

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