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Vida nas organizações Joaquim Santini

O abismo da IA: o que os relatórios mostram — e o que sua empresa realmente precisa fazer

Publicado 26/09/2025 • 17:42 | Atualizado há 3 horas

Foto de Joaquim Santini

Joaquim Santini

Pesquisador e palestrante internacional, diplomado em Psicologia Clínica Organizacional e mestre em Consulting and Coaching for Change no Insead ( european business school, na França), graduado e mestre em Engenharia Mecânica pela Unicamp. Fundador da EXO - Excelência Organizacional.

Unsplash.

Grandes companhias lideram adoção de inteligência artificial no país.

Imagine uma travessia em corda bamba. De um lado, a promessa de ganhos sem precedentes com a inteligência artificial generativa; do outro, a realidade de organizações que caminham, investem, se equilibram — mas raramente chegam ao destino. Essa é a metáfora que melhor traduz o momento atual da IA nos negócios.

Em julho de 2025, um relatório do MIT sobre o estado da IA nos negócios trouxe números que impressionam: apesar de investimentos estimados entre US$ 30 e 40 bilhões, 95% das empresas não conseguem extrair retorno real de suas iniciativas em GenAI. Apenas 5% conseguiram transformar pilotos em valor mensurável.

A pesquisa analisou mais de 300 iniciativas públicas, entrevistas com 52 organizações e questionários com 153 líderes seniores. O retrato é claro: vivemos um cenário de alta adoção, mas baixa transformação. Ferramentas como ChatGPT e Copilot são amplamente utilizadas, mas mudanças estruturais só aparecem em setores como tecnologia e mídia. Áreas inteiras, como saúde, energia e indústria, seguem praticamente intocadas.

Esse GenAI Divide se manifesta em cinco padrões centrais. E aqui está o ponto: concordo com o diagnóstico, mas o problema não é apenas técnico. Ele revela também forças emocionais e inconscientes que a pesquisa não captura — mas que todo líder sente no dia a dia.

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Alta adoção, baixa transformação

O estudo mostra que mais de 80% das empresas testaram GenAI, mas quase nenhuma alterou profundamente seus modelos de negócio. Por quê? Porque muitos projetos são iniciados para “mostrar modernidade” e alimentar narrativas de inovação, sem tocar nas áreas realmente sensíveis. São pilotos que preservam territórios políticos em vez de mexer onde realmente doeria.

O abismo entre piloto e produção

Apenas 5% dos projetos corporativos de IA chegam à produção. O relatório aponta falhas técnicas: sistemas frágeis, sem memória, que não se adaptam. Mas, na prática, escalar um projeto significa enfrentar resistências silenciosas, disputas entre áreas e medos difusos de substituição. O abismo é técnico, mas também emocional e político.

A economia invisível da IA

Enquanto os projetos oficiais emperram, cresce um fenômeno subterrâneo: a “shadow AI economy”. Mais de 90% dos trabalhadores afirmaram usar IA por conta própria, com contas pessoais de ChatGPT ou Claude. A inovação encontra canais alternativos quando a estrutura oficial bloqueia. É o inconsciente coletivo da organização criando suas próprias saídas. Esse dado revela algo profundo: o futuro não pede autorização, ele se infiltra.

O enviesamento dos investimentos

Segundo o relatório, cerca de 70% dos orçamentos vão para marketing e vendas, enquanto áreas de back office — onde o ROI costuma ser maior — são negligenciadas. Essa escolha é reveladora: prefere-se investir no que aparece para o conselho e para o mercado, em vez de fortalecer as engrenagens que realmente sustentam a organização. É a lógica da visibilidade sobre a lógica da transformação.

A lacuna do aprendizado

O verdadeiro gargalo não é regulação, nem talento, mas a falta de aprendizado. A maioria das ferramentas não retém feedback, não se adapta ao contexto, não evolui. Mas esse déficit também é organizacional. Muitas empresas não querem aprender com seus erros, porque isso implicaria expor fragilidades e revisar crenças estabelecidas. A tecnologia não aprende — e a empresa também não.

A leitura invisível

O relatório do MIT descreve com precisão a superfície: processos, workflows, métricas. Ele mostra onde os investimentos se concentram, quais setores avançam mais rápido e por que tantos pilotos morrem no caminho. Mas falta o invisível. Falta o que não cabe em gráficos: os medos difusos, as lealdades silenciosas, as disputas de território.

O que bloqueia a travessia não é apenas infraestrutura ou integração. É a dimensão invisível da vida organizacional — esse tecido feito de vínculos, resistências e crenças não-ditas que sustentam (ou sabotam) qualquer transformação. Ela envolve os medos coletivos de perda, as lealdades subterrâneas a antigos modos de operar, os pactos silenciosos que ninguém assume, mas todos obedecem.

Um workflow nunca é neutro. Ele carrega histórias. Representa quem manda e quem obedece, quem legitima e quem é ignorado. Cada fluxo contém pactos de poder, zonas de pertencimento, hierarquias sutis que se repetem como rituais. Quando um agente de IA entra em cena, ele não reorganiza apenas etapas de um processo: ele desloca identidades.

O gerente que antes era árbitro final pode sentir-se reduzido a carimbo. A equipe que encontrava sentido em tarefas repetitivas descobre-se sem lugar. O jovem talento que aprendia pelo fazer manual se vê diante de um vazio de formação. O que tecnicamente se chama “automação” é vivido subjetivamente como um luto coletivo.

E onde há luto, há também resistência. Não a resistência explícita, que pode ser discutida em reuniões, mas resistências silenciosas: atrasos deliberados, cinismo disfarçado de pragmatismo, pilotos que nunca “amadurecem” por falta de adesão.

É por isso que não basta selecionar melhores fornecedores, escolher ferramentas mais robustas ou redesenhar fluxos com consultores brilhantes. O verdadeiro desafio é preparar lideranças para lidar com essa dimensão invisível:

  • sustentar desconfortos em vez de anestesiá-los com discursos motivacionais,
  • nomear tensões em vez de escondê-las atrás de métricas,
  • transformar pactos silenciosos em conversas reais.

A GenAI Divide que o MIT identifica com números é, em última instância, também uma ruptura silenciosa entre discurso e prática: entre o que a empresa diz querer (inovação, transformação, disrupção) e o que, no fundo, teme perder (autoridade, relevância, identidade).

Conclusão – O que sua empresa realmente precisa fazer

O abismo da IA não é apenas técnico, mas humano. Não basta olhar para relatórios, métricas e workflows. É preciso atravessar o invisível: medos coletivos, pactos silenciosos e resistências que bloqueiam a transformação.

E o que sua empresa realmente precisa fazer?

  1. Assumir que um workflow nunca é neutro → cada processo carrega poder, pertencimento e identidade. Mudar fluxos significa reorganizar relações.
  2. Tratar a adoção da IA como um processo emocional → implantar tecnologia exige elaborar lutos simbólicos, sustentar desconfortos e ressignificar papéis.
  3. Olhar para onde ninguém investe → em vez de concentrar energia apenas no que aparece (marketing, visibilidade), priorizar as áreas estruturais que sustentam a organização.
  4. Aprender de verdade → não só ensinar as máquinas a evoluir, mas ensinar a própria empresa a enfrentar seus erros e vulnerabilidades.

A travessia não se faz apenas com tecnologia mais sofisticada. Faz-se com liderança capaz de transformar vínculos invisíveis em novas possibilidades de futuro.

Esse é o ponto que os relatórios mostram pela metade. Porque, no fim, não é o algoritmo que separa vencedores de perdedores — é a coragem de líderes em atravessar o abismo humano da IA junto com suas equipes.

FONTE: The GenAI Divide STATE OF AI IN BUSINESS 2025 (MIT)

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