Quando a Texas Instruments anunciou, em julho, um megaprojeto de fabricação de US$ 60 bilhões, foi uma aposta ousada de que empresas quisessem produzir em massa microchips fundamentais em solo norte-americano. Em agosto, a Apple prometeu fazer exatamente isso.
Durante a mesma coletiva no Salão Oval, em que o presidente Donald Trump anunciou uma tarifa de 100% sobre chips de empresas que não fabricam nos EUA, o CEO da Apple, Tim Cook, aumentou o compromisso de gastos da empresa nos EUA para US$ 600 bilhões nos próximos quatro anos, acima do anúncio original de US$ 500 bilhões feito em fevereiro.
Parte desses gastos, disse Cook, será destinada à produção de “semicondutores essenciais” para iPhones e outros dispositivos nas novas fábricas de chips da Texas Instruments em Utah e Texas.
Em julho, a CNBC se tornou a primeira organização de notícias a ver o interior da nova fábrica da TI em Sherman, Texas. Lá, a produção completa está prevista para começar até o final de 2025. É uma das sete novas fábricas que a fabricante de chips está construindo nos EUA para fornecer componentes a grandes clientes como Nvidia, Ford Motor, Medtronic e SpaceX.
Embora a Texas Instruments não fabrique os chips mais avançados do mundo, seus componentes essenciais estão presentes quase em todo lugar, desde smartphones até unidades de processamento gráfico que alimentam a IA generativa.
“Se você tem qualquer coisa que se conecta à tomada, ou que tenha bateria, ou cabo, provavelmente contém mais de um chip da TI”, disse Mohammad Yunus, vice-presidente sênior de tecnologia e manufatura da TI.
Mas apenas um mês depois do anúncio do projeto de US$ 60 bilhões, as ações da TI despencaram 13% devido a previsões fracas e preocupações sobre tarifas levantadas na teleconferência de resultados de 23 de julho.
“A preocupação são os clientes finais. Diante da incerteza tarifária, eles não sabem o que esperar. Estão acumulando estoque?” disse Stacy Rasgon, analista sênior da Bernstein Research.
Ainda não se sabe se a demanda permanecerá alta quando as incertezas tarifárias diminuírem. Ainda assim, as ações recuperaram parte do terreno perdido em agosto.
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Avançando para 300 mm
Embora a TI seja conhecida por suas calculadoras gráficas, a empresa também é responsável por ajudar a revolucionar a indústria eletrônica. Em 1958, o engenheiro da TI Jack Kilby registrou a primeira patente de um circuito integrado. Isso abriu caminho para a miniaturização de chips ao construir todos os componentes de um circuito, e não apenas os transistores, diretamente em um único pedaço de silício.
A maior parte dos negócios da TI atualmente vem de clientes automotivos e industriais que compram seus chips analógicos e embarcados. Chips analógicos processam sinais como som, luz e pressão, como a temperatura de um termostato ou a voltagem em chips de gerenciamento de energia que mantêm os eletrônicos seguros quando conectados.
Chips embarcados são tipicamente processadores de sinais e microcontroladores que operam dispositivos do dia a dia, como avisar a torradeira para tocar, a lava-louças para terminar um ciclo ou acionar o freio ABS.
Ao contrário dos caros chips de ponta de 2 e 3 nanômetros feitos por gigantes como a TSMC, os chips da TI são fabricados em nós mais antigos e baratos: de 45 a 130 nanômetros.
Esse tamanho “é o ponto ideal para analógicos e embarcados, porque oferece o desempenho, a potência e a voltagem que nosso portfólio precisa”, disse Yunus.
Embora cada chip da TI custe cerca de US$ 0,40, segundo Arcuri, eles desempenham papéis de suporte cruciais para as tecnologias mais avançadas do mundo. Em uma nova parceria com a Nvidia, por exemplo, a TI está desenvolvendo um chip para aumentar a eficiência em data centers de alto consumo de energia.
Em 2009, a TI tomou outra medida ousada para reduzir ainda mais o custo de seus chips. A empresa abriu a primeira fábrica do mundo de 300 milímetros para chips analógicos, reutilizando uma fábrica de memória da Qimonda após a falência da fabricante durante a crise financeira.
“Isso foi realmente o catalisador para a TI obter tal vantagem de custo”, disse Arcuri.
O novo tamanho de wafer proporciona à TI “uma eficiência de custo enorme”, porque 300 mm podem comportar “2,3 vezes mais chips do que um wafer de 200 mm”, disse Yunus. A TI tem fechado e vendido algumas de suas fábricas de 200 mm, e todas as sete novas fábricas produzirão em wafers de 300 mm.
“Eu os posicionaria mais como vencedores de tarifas do que perdedores”, disse Timothy Arcuri, diretor da UBS. Arcuri afirmou que a fundição da TI nos EUA permitirá à empresa praticar preços inferiores aos chips fabricados em Taiwan por seus concorrentes.
O mercado para os chips da TI, entretanto, não é garantido. Depois que a TI teve dificuldade em atender à demanda durante a escassez de chips em 2020, Arcuri disse que a participação da TI no mercado de chips analógicos “caiu drasticamente”. Passou de 19,8% em 2020 para 14,7% em 2024, segundo a UBS.
O megaprojeto de US$ 60 bilhões da TI inclui quatro fábricas em Sherman, Texas, uma em Richardson, Texas, e duas em Lehi, Utah. As novas fábricas darão à TI cinco vezes a capacidade que possui hoje, disse Yunus à CNBC.
“Eles estão fazendo uma grande aposta no fato de que recuperarão participação de mercado e que a demanda voltará com força”, disse Arcuri. “Se você não recuperar essa participação, é difícil justificar a construção de tanta capacidade.”
Fornecimento global, crescimento no Texas
A TI disse à CNBC que é a maior fabricante de semicondutores analógicos e embarcados do país, vendendo dezenas de bilhões de chips a cada ano. Cerca de 60% da receita vem de clientes fora dos EUA, com a China representando cerca de 20%.
Cerca de 75% dos gastos de capital da TI acontecem nos EUA, mas a empresa também fabrica chips no exterior, em fábricas na Alemanha, Japão e China, disse a empresa à CNBC. Ela realiza testes e montagem no México, Taiwan, Filipinas e Malásia, onde está investindo US$ 3 bilhões em dois novos sites, sendo que um deles já está em produção.
A presença global da TI é uma vantagem na “situação dinâmica” das tarifas atualmente, disse Yunus.
“Nossa manufatura em 15 sites diferentes nos posiciona para apoiar nossos clientes, não importa onde estejam e em qualquer ambiente político ou econômico”, disse ele.
Embora a TI tenha considerado construir seus novos sites internacionalmente, em lugares como Cingapura, a empresa acabou optando por Sherman, Texas. A pequena cidade, a 105 km ao norte de Dallas, tem apenas 50 mil habitantes. Também abriga uma fábrica da GlobalWafers, empresa baseada em Taiwan que produz os wafers de silício nos quais os chips, incluindo os da TI, são fabricados.
O prefeito de Sherman, Shawn Teamann, disse que a cidade agora é “o centro do Silicon Prairie”.
O avô de Teamann trabalhou ao lado de Kilby na TI na década de 1950. A TI chegou a Sherman pela primeira vez em 1966, mas quando anunciou planos de fechar sua fábrica antiga de 150 mm, a cidade convenceu a TI a permanecer oferecendo incentivos como isenções fiscais e descontos na água.
O plano funcionou, e em 2021 a TI anunciou que permaneceria em Sherman com um campus de novas fábricas de 300 mm. Agora, a primeira das quatro fábricas de 300 mm está concluída em Sherman. Teamann disse que o projeto de 300 mm mais do que dobrou a taxa de crescimento populacional da cidade desde que foi anunciado em 2021.
Quanto ao apoio federal, a TI recebeu US$ 1,6 bilhão de financiamento do CHIPS Act e um impressionante crédito fiscal de 35% do grande projeto de lei de Trump aprovado em julho.
No nível estadual, o governador Greg Abbott há muito oferece incentivos para empresas de chips que queiram se instalar no estado, desde impostos baixos até o CHIPS Act do Texas de US$ 1,4 bilhão, aprovado em 2023.
A Samsung é outro gigante de chips no Texas desde 1996. A empresa sul-coreana está construindo uma fábrica avançada de chips de US$ 17 bilhões perto de Austin. É também onde Apple, Amazon e AMD projetam muitos de seus chips. Outras empresas de chips no Texas incluem Infineon, NXP, X-Fab, Micron, GlobalFoundries e o fornecedor de equipamentos Applied Materials.
Água, energia, trabalhadores
Fabricar chips exige uma quantidade imensa de água, e cerca de um quarto do Texas enfrenta seca. Felizmente, Sherman possui direitos de uso da água do próximo Lago Texoma.
“Tratou-se de adquirir mais direitos, aumentar nossa produção e conseguir fornecer a enorme quantidade de água necessária para operar uma fábrica de semicondutores”, disse Teamann, acrescentando que a fábrica quase dobrou a quantidade de água usada em Sherman.
A TI usará cerca de 1.700 galões de água por minuto quando a nova fábrica de Sherman estiver concluída, com planos de reciclar pelo menos 50% disso, disse Yunus.
A fabricação de chips também consome muita energia, por isso ajuda o fato de Sherman ter uma usina que recentemente aumentou sua capacidade. A nova fábrica de Sherman da TI funcionará totalmente com energia renovável, disse Yunus, acrescentando que fabricar chips em wafers de 300 mm também melhora a eficiência energética.
“Você usa praticamente a mesma quantidade de energia, mas produz de 2,2 a 2,3 vezes mais chips”, disse ele.
A rede elétrica singularmente independente do Texas impede, em grande parte, que o estado pegue energia emprestada de outros estados. Em 2021, essa rede falhou durante uma tempestade de inverno extrema, causando pelo menos 57 mortes e interrompendo a produção de fabricantes de chips como Samsung e NXP. A TI disse à CNBC que manteve as “operações críticas”.
“Construímos redundância nesta instalação”, disse Yunus. “Temos várias linhas de transmissão que fornecem energia ao local. Também temos grandes tanques de armazenamento de diesel que podemos usar, e geradores que podem continuar a alimentar o local por alguns dias.”
Engenheiros altamente qualificados para chips são outro recurso escasso. É um fluxo de talentos que foi prejudicado pelo declínio dramático da fabricação global de semicondutores nos EUA. Segundo a Semiconductor Industry Association, os EUA passaram de uma participação de 37% no mercado em 1990 para apenas 10% em 2022.
Mas a TI desenvolveu parcerias com várias universidades, faculdades comunitárias e o setor militar para suprir a lacuna de talentos necessária para preencher as funções na fábrica de Sherman.
“Há muitos jovens se mudando para a região. Na verdade, acho que será mais fácil para eles conseguirem talentos agora do que seria há 5 a 10 anos”, disse Arcuri.
Com o projeto completo de US$ 60 bilhões, a TI disse esperar criar 60.000 empregos nos EUA, mas a empresa não pôde fornecer uma data prevista de conclusão quando solicitada.
“É difícil prever exatamente quando isso vai decolar”, disse Yunus. “Estamos esperançosos de que continuaremos a construir em um ritmo bastante acelerado, mas isso realmente depende do mercado.”
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